Margarete dormiu demais e chegou atrasada em vinte minutos ao trabalho hoje, com sono. Preferiria que fosse em sete horas, assim não precisaria trabalhar tanto. Como trabalhava Margarete! E como odiava o que fazia!
Margarete era servidora pública, trabalhava no Instituto Nacional de Seguro Social, INSS. Na época em que ela começou nem era esse o nome. Margarete estava ficando velha. Fizera o concurso em 1989, quando ainda era secretária no escritório de contabilidade de seu tio. Naquele tempo não imaginava que o serviço público poderia ser tão maçante, tanto quando o ócio público, situação por que passava na maior parte do tempo.
Certa feita, lá por 1999, 2000, o pessoal da direção da autarquia decidiu substituir as máquinas de escrever por aquilo que Margarete considerava a maior invenção já criada pelo homem: o computador pessoal. A panaceia lhe prometida – instrumento que Margarete poderia usar tanto para aliviar o tédio e o cansaço do trabalho jogando paciência quanto para observar por oito horas diárias um papel de parede estampando seu cachorro, maior amor de sua vida –, entretanto, parecia não estar funcionando corretamente.
Margarete ligou o computador e apertou os botões do teclado: “O-I”. Olhou para a tela de fundo verde-água e não viu nada escrito. Tornou a afundar o dedo no teclado branco: “I-N-S-S-Espaço-T-E-S-T-E”. Mirou a tela mais uma vez, e nada. Margarete, com sangue nos olhos e fogo nas narinas, constatou que recebera uma máquina estragada. Justo ela, que mais precisava de um meio eficiente para procrastinação. Ligou para o ramal da direção:
– Alô?
– Quem?
– Quem tá falando?
– Não é da direção?!
– Sim, quem é??
– Margarete, do desenvolvimento. E tu?
– Ah!. Diga, Margarete, é o Alberto.
– O Stanislau tá aí, Alberto?
– O Stanislau… Peraí. […] Tá, quer falar com ele?
– Me passa ele, faz favor.
[…]
– Fala, Margarete!
– Stan, o computador tá com problema.
– Como assim? O que instalarem hoje?
– Sim. Não sei se é só o meu, mas a porcaria não tá funcionando!
– Vou pedir pra descerem aí. Tu tá na tua sala?
– Sim.
– Vou mandar o pessoal aí então daqui a pouco.
O pessoal chegou à sala, apático, e através de um levante de sobrancelhas questionou o que havia acontecido. Margarete apontou para a tela, tremendo um pouco. Sofria de pressão baixa. Até aí não houve nenhuma comunicação verbal – também não precisava, tudo transcorria bem.
– Não tá abrindo nenhum programa? – perguntou o pessoal.
– Não tá escrevendo! – explicou Margarete.
– Mas onde a senhora tá escrevendo?
– No computador, ué!
– A senhora já iniciou o programa de texto?
– Sim, o computador iniciaram quando vieram instalar ele.
– Não, digo… O Word.
– Oi?
Margarete ouviu a explicação e riu nervosamente. Foi para casa mais cedo naquele dia.