Freudenfreude

Voltaire é meu gato. Voltaire tem um brinquedo que consiste numa bolinha de pingue-pongue coberta por lã e com um guizo na parte de dentro. Voltaire já destruiu essa bolinha de tanto brincar. Comprei uma bolinha nova para que Voltaire continuasse a poder brincar com um brinquedo inteiro. Voltaire ignorou a bolinha nova e continua a brincar com a bolinha antiga, hoje em frangalhos.

Assistir ao Voltaire brincando com aquela bolinha me causa um sorriso no rosto de uma sinceridade que não estou acostumado a sentir. Me sinto feliz por ver o Voltaire feliz. Uma espécie de empatia.

No idioma alemão existe a palavra schadenfreude, que significa, em linhas gerais, o excitamento ou a satisfação maliciosa de ver o infortúnio, a desgraça alheia (schaden = dano, prejuízo; freude = satisfação, prazer). Por derivação, por necessidade, provavelmente (a língua alemã é muito rica), criou-se a palavra freudenfreude, que, como pode-se imaginar, significa a satisfação e o prazer de ver o prazer e felicidade alheios.

Isso descreve de maneira muito precisa o que eu sinto quando vejo meu gato se divertindo.

Imagino que o mesmo aconteça com pais quando veem seus filhos se divertindo, fazendo coisas legais e indo bem na escola. Aliás, acho que a diferença entre ter um animal de estimação e um filho, assim como disse Darwin em relação a diferença entre um primada e um humano, é de grau, não de gênero.

Ambos demandam responsabilidades e a retribuem com prazer, para os donos ou para os pais. É quase como um investimento. Sopeso o quanto de investimento financeiro e afetivo posso dispensar por mês e analiso o quanto de prazer me será retribuído. Se a conta for positiva, vale a pena. Se não, não.

Aliás, me parece que essa conta pode ser estendida a qualquer tipo de relação humana não-profissional, não-familiar e que não envolva outro fato de obrigação social, como é o caso da relação familiar. Ou seja, a conta se aplica para relacionamentos fraternais e amorosos em geral. Talvez não seja a única, mas se aplica.

No caso dos relacionamentos amorosos, além desse fator custo-benefício, tem outra questão muito importante, o contrato social-amoroso. Explico. Jean-Jacques Rousseau, em O Contrato Social, diz, basicamente, que o homem, em determinado momento da história, teoricamente, decidira abdicar de sua condição de ente em estado de natureza, onde vale a lei do mais forte, para fazer parte de uma sociedade, onde a lei da força é substituída pela justiça. Rousseau explica que o homem faz isso, entrega parte de sua liberdade à sociedade, ao Estado, porque em troca receberá segurança. Não precisará sair no tapa toda vez que se vir em uma situação litigiosa, terá leis claras a obedecer, etc.

O pacto a que Rousseau se referia dizia respeito a uma relação homem-sociedade. O pacto social-amoroso diz respeito a uma relação homem(sujeito)-possíveis parceiros. Em uma relação amorosa, além de avaliar se ela será benéfica para mim, eu escolho tê-la pela segurança que ela me proverá. Segurança no sentido sexual. Em troca de ceder parte da minha liberdade a uma outra pessoa, não precisarei mais procurar por parceiros sexuais, pois já o tenho. A liberdade que é restringida é justamente a de poder se envolver em qualquer ato sexual com um terceiro sujeito. Concordam?

Err… Eu já nem sei como vim parar nesse assunto. Ultimamente tenho passado muito tempo na internet e provavelmente o hipertexto tenha me contagiado negativamente.

Abraços.

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