Balada de William Worthy

Hoje assisti ao filme “Depois de Maio” (Après Mai), do diretor francês Olivier Assayas, que retrata a história de um jovem francês durante as revoluções de maio de 1968 e o aftermath do movimento pela perspectiva do protagonista. O filme em si não me agradou – o enredo é muito truncado, o filme é demasiadamente longo (o que não seria um problema, se fosse mais chamativo) e o motivo é confuso, apesar de ter recebido e sido indicado a uma série de prêmios. O que me chamou mesmo a atenção foi uma música interpretada por um personagem secundário, norte-americano, durante uma cena que se passa na Itália, onde cantava um refrão bastante interessante:

“William Worthy isn’t worthy to enter our door
Went down to Cuba, he’s not American anymore
But somehow it is strange to hear the State Department say
‘You are living in the free world, in the free world you must stay’”

A música, descobri depois, era “Ballad of William Worthy”, composta pelo norte-americano, texano, Phil Ochs. Eis:

http://www.youtube.com/embed/pmkZOHN9qvA

A música dramatiza a história de William Worthy, um norte-americano negro ativista dos direitos civis que lutava pelo direito de viajar independentemente das proibições impostas pelo governo norte-americano. A letra da música é bastante irônica, e toma de maneira jocosa o posicionamento do Departamento de Estado Norte-Americano sobre a história de Worthy.

“Well, it’s of a bold reporter whose story I will tell
He went down to the Cuban land, the nearest place to hell
He’d been there many times before, but now the law does say
The only way to Cuba is with the CIA.”

William, em 1956 e 1961 viajou para China e Cuba, respectivamente, violando proibições impostas pela autoridade norte-americana. Quando retornou da China aos Estados Unidos, um ano depois de sua partida, teve seu passaporte confiscado. Uma ação judicial tentou recuperá-lo, mas não teve sucesso. Sem passaporte, Worthy viajou então para Cuba, durante o governo de Fidel Castro, e quando retornou aos Estados Unidos foi processado e condenado pelo crime de “retornar aos Estados Unidos sem passaporte válido”. Após apelação, seu advogado conseguiu inocentá-lo e provar a inconstitucionalidade da proibição.

Uma audição desatenta da letra da música pode até confundir o posicionamento de seu autor, Phil Ochs, justamente pela maneira sarcástica com que trata o assunto, entretanto, Ochs é conhecido principalmente por suas músicas de protesto, sendo essa uma delas.

Algumas frases da letra são geniais, como a que diz “You are living in the free world, in the free world you must stay”, satirizando o posicionamento do Departamento de Estado e a incongruência entre o ethos norte-americano e o discurso liberalista do governo de um lado e as fortes imposições e restrições ao cidadão de outro.

A letra completa da música pode ser encontrada aqui.

Uma biografia bastante concisa da vida de Worthy, assim como a lista de livros publicados por ele, pode ser encontrada na Wikipedia, de onde, aliás, tirei algumas informações para o post.

essential