O conceito de “apropriação cultural”, nesses termos, realmente não faz muito sentido: cultura é um emaranhado fluido de apropriações, iterações e reapropriações. Qualquer conceito de cultura como objeto capaz de “originalidade” ou “pureza”, que possa ser apropriado por uma outra cultura com iguais atributos, está fundamentalmente errado. Carece de fundamentação antropológica ou histórica. Ao mesmo tempo, quem acha que isso invalida o conceito de apropriação cultural está também errado. Incorre numa espécie de falácia gramatical: achar que o significado de uma expressão é exata e exclusivamente o mesmo de sua interpretação literal. Por exemplo, seria o mesmo que dizer que a expressão “abrir os olhos” é errônea, já que o que se abrem são as pálpebras, não os olhos. O exemplo é exagerado, mas serve para demonstrar que a mera interpretação gramatical não serve para nos explicitar o significado de uma expressão. Criticar qualquer teoria, tese ou conceito pelo seu nome, por esse motivo, é algo arriscado, já que ele nem sempre é um descritor fiel de seu conteúdo.
Em suma: é perfeitamente possível achar, ao mesmo tempo, que apropriação cultural “não existe”, nesses termos, e que é um problema. (Sobre por que é um problema, há inúmeros textos por aí).