Eu gosto de sair sem celular às vezes para poder não me distrair e observar com atenção os belos fenômenos da natureza que a vida em sociedade nos proporciona. Um que fazia tempo que não me ocorria, mas que tive a sorte de ver ontem, foi o da turma do escritório saindo junta pra almoçar.
Não é uma coisa que acontece assim a torto e a direito. O fenômeno tem horário mais ou menos delimitado – algum momento do meio-dia à uma e meia. E o observador tem que estar ao redor de alguma área que tenha (1) escritórios, (2) restaurantes e que (3) os escritórios e os restaurantes não fiquem no mesmo prédio. A esquina da Borges de Medeiros com a Ipiranga, exato local onde eu me encontrava ontem às quinze pra uma, é um exemplo de lugar ideal. De um lado, o Shopping Praia de Belas, de outro, um pequeno aglomerado de prédios comerciais na Borges e prédios do judiciário uma quadra atrás.
Não é difícil identificar uma turma do escritório saindo junta pra almoçar quando se vê uma. Ontem eu vi duas, para minha felicidade, e só consegui saber que não eram a mesma porque as vi ao mesmo tempo numa distância curta. Visualmente, a turma indo almoçar segue um padrão estético homogêneo. É composta majoritariamente de homens. Vestem todos alguma variação de camisas oxford em tons pastéis ou camisas polo em cores genericamente feias. As pernas são cobertas por diferentes tons de jeans lavado, brim caqui ou calças formais com corte slim fit.
O espaço próprio da turma do escritório indo almoçar é a rua, principalmente a calçada de um lado da faixa de segurança, onde esperam o sinal abrir para atravessar. O ambiente geral é de uma descontração forçada. Uma mistura de catarse individual por terem conseguido evitar que o almoço fosse um pastel delivery comido na frente do computador, mas tudo isso como se participassem de um reality show e estivessem sendo observados. No caso, não por uma câmera de TV, mas pela própria consciência, que sabe que tem trabalho atrasado na mesa, e que talvez teria sido melhor chamar um delivery mesmo pra não deixar acumular mais ainda. Os movimentos são mais ou menos calculados, com o cálculo diminuindo proporcionalmente com o tempo de firma.
O caminhar é ostensivamente despreocupado: O tronco fica assentado sobre os quadris, levemente caído para trás, e a locomoção é feita através de chutinhos para frente, enquanto os braços balançam como que livremente. O movimento guarda uma despretensão triste. Tem trabalho atrasado, seria bom não demorar muito, mas esse é o meu horário de almoço, esse momento é MEU, tenho que descansar a cabeça pelo menos uma vez ao dia. As mãos vão para os bolsos da calça quando o comboio pára em alguma esquina, até o sinal abrir. Quando o sinal abre, o grupo segue caminho até o shopping. Perdem-se da vista do observador externo até o próximo momento do traslado: a turma do escritório voltando do almoço. A dinâmica é a mesma, só que com um pouco menos de assunto, depois de todos os desbloqueadores de conversa já terem sido usados na mesa do buffet livre.